Ocorreu, que em uma tarde fria e chuvosa uma menina, com um casaco vermelho, estava sentada em uma escada que ligava uma rua a outra. Ao seu lado só havia uma grama verde e molhada. Na rua, à sua frente, pessoas passavam correndo o mais rápido que a chuva, como se fugissem de algo que a machucassem. O simples casaco vermelho já estava ensopado, perdendo sua função de aquecimento e isso fez com que, em um simples gesto, ela o tirasse mostrando o belo vestido branco que usava. Levantou-se da escada quando ouviu uma música que lhe chamou a atenção e em passos leves e curtos foi em direção ao som tão agradável. Ela parecia flutuar enquanto a água da chuva ensopava os seus cabelos longos. Deu-se conta que o som estava saindo de uma casa, um tanto simples, com a tinta do portão descascada. Parou em frente, procurou a campainha, porém não a encontrou. Decidiu então, jogar uma pedra na janela já que bater palmas não adiantaria devido ao barulho da chuva. No entanto, antes que alguém a atendesse percebeu que o portão estava aberto e em um ato de coragem abriu-o e entrou. Rodou a fechadura da porta da frente e quando a empurrou deparou-se com alguém ao longe tocando flauta transversal, cuja melodia que emitia era: “Eu te Devoro”, Djavan. Aproximou-se e tocou-lhe os ombros o mais suave possível. Ele virou-se e a olhou. Os seus olhos castanhos e profundos transmitiram uma energia mais forte do que ela poderia suportar, mas a sintonia que havia entre eles era inquestionável. Palavras não eram necessárias para que uma comunicação clara fosse estabelecida. O olhar dele parecia estar distante e desligado daquele mundo presente, porém ela o conseguia compreender mesmo não estando dentro da sua realidade. O seu mundo era colorido como se misturasse as sete artes. Havia quadros com pinturas abstratas para todos os lados e instrumentos dos mais variados tipos. Foi quando ela avistou um violão, pegou-o e começou dedilhar na mesma sintonia da melodia da flauta. Ali permaneceram durante, aproximadamente, uma hora até que a chuva parou. Então, ela levantou e percebeu que seu vestido branco havia molhado a cadeira. Dirigiu-se em direção à porta e em busca da sua realidade. No entanto, algo de diferente aconteceu ali. Ele tinha a plena convicção de que ela voltaria, pois o pedaço de papel que encontrou ao lado da cadeira que ela havia sentado, continha a seguinte frase: "A vida é a arte do encontro, embora haja tantos desencontros pela vida." (Vinicius de Moraes).